Às 18:20 de 16 de outubro de 1834, um incêndio começou no antigo Palácio de Westminster, em Londres – o mais importante local da governança parlamentar do Reino Unido e do Império britânico. O fogo, que consumiu-o até as primeiras horas da manhã, destruiu o complexo medieval, de modo que nem mesmo o restauro foi considerado uma opção viável – um novo palácio teria que se erguer das cinzas para cercar a grande parte intacta de Westminster Hall. [1] O fogo deu ao Reino Unido a chance não apenas de substituir o que era considerado desatualizado, numa miscelânea de edifícios governamentais, mas de erguer um monumento gótico para encarnar espiritualmente a preeminência do Reino Unido em todo o mundo, e as raízes da democracia moderna.
Do final do século XI até o reinado de Henrique VIII, o Palácio de Westminster serviu como residência real. Vários monarcas da Inglaterra e do Reino Unido (Inglaterra, país de Gales, Escócia e Irlanda do Norte) fizeram as suas próprias amplisçõrs e renovações ao palácio à medida que os séculos passavam. O grande salão do palácio, conhecido como Westminster Hall, foi concluído em 1099 por Guilherme II; Richard II remodelaria-o posteriormente, removendo as colunas normandas que suportavam o telhado, substituindo-as junto a um telhado de madeira do tipo "hammerbeam" que permanece até os dias de hoje. Depois de Henrique VIII ter movido a residência real para longe de Westminster em 1534, o palácio passou a ser utilizado pelo Parlamento britânico. [2]
As décadas de 1830 e 1840 foram uma época tumultuada para o Reino Unido: a Europa continental estava inundada por revoluções, a fome atingiu a Grã-Bretanha e a Irlanda, e a agitação política estava mudando a paisagem do governo britânico. Quando a Câmara dos Comuns (corpo eleito do Governo) lançou um concurso para o projeto do novo Palácio de Westminster, especificaram que as propostas deveriam ser nos estilos Neo-Gótico ou Neo-Elizabeth – um gesto simbólico que iria conectar o novo edifício à ordem, estabilidade e proeza do passado da nação. [3]
Um terreno retangular, medindo aproximadamente 244 por 107 metros ao longo da margem do Rio Tâmisa, foi apresentado. Preservando o Westminster Hall, os arquitetos foram obrigados a fornecer câmaras tanto para a Câmara dos Lordes como à Câmara dos Comuns, uma variedade de escritórios, e acomodações para oficiais que precisavam estar de prontidão a todo o momento. [4] Das 97 propostas apresentadas, a Comissão Parlamentar concedeu o primeiro lugar a Charles Barry – arquiteto de numerosas igrejas, casas de campo (incluindo o Castelo Highclere, da famosa série Downton Abbey) e edifícios cívicos. [5]
Embora a proposta inicial de Barry, com desenhos de Augustus Pugin, tivesse garantido grande e suficiente impressão para vencer o concurso, ele foi selecionado com a ressalva de que precisaria de significativas revisões. Ao longo dos anos seguintes, o edifício evoluiu substancialmente em planta e fachadas: as duas Câmaras do Parlamento se mudaram para acomodar um novo salão octogonal central, seções do edifício foram realinhadas, e as duas torres cresceram ainda mais, com a do norte tornando-se a torre de relógio (agora abrigando o sino, Big Ben). Neste processo, o que havia sido originalmente uma proposta comparativamente econômica tornou-se cada vez mais extravagante, atraindo a ira do povo contra o Parlamento e Barry. [6]
A construção foi iniciada em 27 de abril de 1840 por Sarah Barry, esposa de Charles Barry. A partir desse momento, 775 mil metros cúbicos de pedra foram enviados e montadas no palácio composto por 1.180 quartos, dois quilômetros de corredores, e 126 escadas. [7] A pedra escolhida foi um calcário arenoso da pedreira de Anston em Yorkshire e, embora o material fosse comparativamente barato e adequado à emaranhada escultura, provou-se ineficaz em resistir à poluição do carvão presente na industrial Londres tendo que ser substituída entre 1928 e 1960. [8]
Ao final, o novo Palácio de Westminster, apresentou um total de 278 metros de comprimento ao longo do Rio Tâmisa, pontuado por torres erguidas e as três principais torres que dominam o complexo. [9] Torre Victoria, a maior e mais alta das três, foi construída para coroar a entrada do soberano (segundo a tradição, o monarca nunca poderia andar perto da Câmara dos comuns) e abriga registros do Parlamento. A torre central, que foi construída para a ventilação, assume a forma de um pináculo, visualmente contrastando com as torres em cada extremidade do palácio. A torre do relógio, muito recentemente chamada de Torre Elizabeth em homenagem à Rainha Elizabeth II, comumente conhecida como Big Ben, apresentou um desafio para Barry, que lutou para produzir um projeto que tornasse o relógio suficientemente proeminente. A solução final foi projetar o mecanismo para fora das laterais da torre e as quatro faces do relógio foram projetadas por Pugin. [10, 11]
Atrasos e conflitos atormentaram Barry durante todo o projeto. As câmaras constantemente consultaram o arquiteto, exigindo-lhe revisões justificadas ante inúmeras comissões, para explicar por que a construção estava demorando tanto tempo e interferindo no processo do projeto. Uma frustração particular foi a insistência do Parlamento para que Barry trabalhasse com o doutor David Boswell Reid, um cientista escocês de credibilidade duvidosa cujos esquemas de ventilação levaram vastas partes do espaço interior a aumentarem a inflamabilidade do palácio. A Câmara dos Comuns foi rejeitada quase imediatamente após sua conclusão em 1850, com críticas à acústica e layout do espaço, o que forçou Barry a alterá-la radicalmente. Tais atrasos foram atribuídos unicamente a Barry, apesar de ele ter seguido fielmente as recomendações dadas pelo Parlamento. Rumores giraram a respeito se o arquiteto renunciaria ao projeto; contudo, ele faleceu em 1860, deixando o restante do trabalho a seu filho. [12]
O novo Palácio de Westminster foi finalmente concluído em 1867, 33 anos após o fogo que havia consumido seu antecessor medieval. Seu esplendor gótico, embora lembre a continuidade do passado, tornou-se um símbolo potente de uma nação em transformação. Quando as revoluções derrubaram grande parte da Europa, as reformas parlamentares do Reino Unido neutralizaram o pior da revolta nas Ilhas Britânicas. [13] As monumentais novas casas do Parlamento, enquanto revestidas por uma interpretação de um tempo passado, permanecem como um ícone proeminente de uma ordem mais recente e democrática - que sobreviveu tanto aos estragos do tempo e da Segunda Guerra Mundial, mantendo-se um dos mais emblemáticos marcos arquitetônicos de Londres.
Referências
[1] Cooke, Robert, Sir. The Palace of Westminster: Houses of Parliament. New York, NY: Burton Skira, 1987. p69-75.
[2] Montague-Smith, Patrick W., and Hugh Montgomery-Massingberd. The Country Life Book of Royal Palaces, Castles & Homes: Including Vanished Palaces and Historic Houses with Royal Connections. London: Country Life Books, 1981. p65-68.
[3] Cannadine, David. The Houses of Parliament: History, Art and Architecture. London: Merrell, 2000. p13-15.
[4] Port, M. H. The Houses of Parliament. New Haven: Published for the Paul Mellon Centre for Studies in British Art (London) by Yale University Press, 1976. p32-33.
[5] Port, p41.
[6] Cooke, p98.
[7] Jones, Christopher. The Great Palace: The Story of Parliament. London: British Broadcasting, 1983. p101.
[8] "The Stonework." UK Parliament. Accessed June 14, 2016. [link].
[9] Cowan, Henry J., and Trevor Howells. A Guide to the World's Greatest Buildings: Masterpieces of Architecture & Engineering. San Francisco: Fog City Press, 2000. p102.
[10] Cannadine, p131.
[11] "The Towers of Parliament." UK Parliament. Accessed June 14, 2016. [link].
[12] Jones, p103-107.
[13] Cowan and Howells, p103.